17/09/2009

CEBs E A TEOLOGIA DA LIBERTAÇÃO

As comunidades Eclesiais de Base, CEBs, surgiram no Brasil nos difíceis e duros anos da ditadura militar no Brasil, sob a inspiração do Concílio Vaticano II, (1962-1965), se espalharam principalmente nos anos 1970 e 80 no Brasil e na América Latina. As CEBs, como se tornaram popularmente conhecidas, eram núcleos populares de nutrição da fé e mobilização por direitos sociais. As CEBs eram grupos de pessoas, principalmente ligadas à Igreja Católica, que morando no mesmo bairro ou nos mesmos povoados, se encontravam para refletir e transformar a realidade à luz da Palavra de Deus e das motivações religiosas. Daí o nome de Comunidades Eclesiais de Base, que se tornaram popularmente conhecidas por CEBs.

A partir de uma vivência bastante intensificada nas comunidades, através de reuniões semanais e, em alguns casos até diárias, em virtude de uma postura de “entrega total à causa”, essas células sociais começavam também a reivindicar pequenas melhorias nas comunidades rurais, nos bairros, mas, ao mesmo tempo, iniciavam uma caminhada para tomar consciência da situação social e política. Queriam a transformação da sociedade. Inspiradas no método "Paulo Freire" de alfabetização de adultos, executavam uma metodologia que levasse da conscientização à ação. Por causa dessa prática encarnada na realidade, com discussões bem concretas, as CEBs tiveram um papel importante no processo de democratização do país.

O professor Faustino Luiz Couto Teixeira, especialista sobre o assunto, escreve que "nos anos 70 e início dos 80, falava-se muito no impacto da atuação das CEBs no campo sócio-político, enquanto geradoras de uma nova consciência das camadas populares e fator de grande importância no processo de libertação dos pobres." Em outras palavras, essas pequenas comunidades cristãs, que tinham de 20 a 100 membros, eram consideradas um novo sujeito popular (Petrini, 1984), capaz de reverter a situação de pobreza e apontando para uma nova sociedade mais justa e fraterna.

Depois veio a chamada abertura democrática e o fim da ditadura, houve a crise no Leste europeu e a decadência do modelo socialista da Rússia; houve a afirmação do capitalismo e o neoliberalismo ganha ainda mais espaço. Com esses acontecimentos que marcaram a segunda metade dos anos 80 e se expandiram nos anos 90, as Comunidades Eclesiais de Base tiveram que repensar sua identidade.

Mais especificamente no interior da Igreja Católica, as CEBs queriam rever uma estrutura muito piramidal, de cima para baixo. Incentivadas pelo Concílio Vaticano II vislumbraram uma maior participação dos leigos e um processo mais participativo de tomada de decisões. Ao redor da imagem de "povo de Deus", que foi caracterizada pelo Concílio, as comunidades sentiram-se parte ativa na construção do Reino de Deus. Houve quem aplaudisse e quem desqualificasse essa atitude como algo que ameaçasse destruir a estrutura de dois mil anos da Igreja. Falava-se da prioridade do carisma sobre a instituição (Frei Leonardo Boff) e usava-se o método das ciências sociais para analisar a Igreja. Substituir a tradicional filosofia pelas ciências sociais representava o risco de introduzir a análise marxista dentro da Igreja. Começou-se, então, a falar do perigo comunista na Igreja e muitos ficaram alarmados.

Um pouco de história

É difícil afirmar com precisão o momento exato do surgimento da primeira Comunidade Eclesial de Base. Mas, sabe-se que os ventos do Concílio Vaticano II sopraram nessa direção. O trabalho Movimento de Educação de Base (MEB), também ajudou no surgimento das CEBs. Desse modo, as CEBs fazem parte dos movimentos mais amplos de renovação eclesial, iniciados no início do século XX e sancionados pelo Concílio Vaticano II. As CEBs no Brasil foi exatamente a experiência única e marcante do Vaticano II. Este Concílio revelou seu potencial pastoral em sua abertura para o mundo e para a história e, ao mesmo tempo, sua densidade de reflexão, postulando a imagem da Igreja como sendo o Povo de Deus a caminho. As CEBs resgataram esses aspectos através da releitura que a Conferência de Medellín, na Colômbia (1968) e Puebla no México (1979) fizeram na América Latina. Medellin preencheu o imaginário eclesial com a temática da Libertação e Puebla com a evangélica opção pelos pobres.

Traços característicos das CEBs

A leitura e a reflexão sobre a Palavra de Deus é um traço característico das CEBs. Muitas comunidades começaram como reuniões bíblicas que iluminavam a vida das pessoas. À medida em que a vida comunitária se organizava foi introduzido também o culto dominical ou a celebração da Eucaristia.

A participação e a discussão dos problemas em forma de assembléia caracterizou muitas Comunidades de Base. A metodologia participativa inclui a colaboração de todos na discussão, na solução e no encaminhamento concreto do problema. Se, por exemplo, o tema é o desemprego, há no final um compromisso concreto que é assumido por todos: preparam-se cestas com alimentos básicos que são distribuídas aos desempregados. Esse espírito desencadeou a emergência de ministérios leigos que foram se multiplicando a partir das necessidades apresentadas pela comunidade. há ministros da Palavra, ministros da Eucaristia, ministros da pastoral da moradia, do trabalho, do menor.

Além das atividades pastorais, muitos serviços englobam mulheres e homens em clubes e pequenas organizações: hortas comunitárias, clubes de mães, alfabetização de adultos e, muitas vezes, grupos de sustentação dos movimentos populares. Esses serviços destacam o compromisso das CEBs com os mais pobres e a relação conseqüente entre fé professada e vida concreta. É propriamente o compromisso com as camadas mais desfavorecidas da população que tornaram as CEBs profundamente ativas no campo social. O pobre não é visto como problema, mas como solução no processo de construir uma nova sociedade.

Por fim, o horizonte para o qual as CEBs se deslocam é a prática concreta de Jesus e o sonho de realizar o Reino de Deus. Termos como justiça, fraternidade, solidariedade, compromisso e caminhada revelam, de um lado, o seguimento de Jesus e, de outro, a vontade de implantar concretamente o Reino de Deus.

As CEBs em Picos

Foi com a chegada de Dom Augusto Alves da Rocha, eleito como primeiro Bispo de Picos em 28 de maio de 1975 e empossado no dia 21 de setembro do mesmo ano, que as Comunidades Eclesiais de Base começaram a funcionar na área geográfica da Diocese de Picos. Antes da chegada de Dom Augusto Rocha, as comunidades existentes desempenhavam mais intensamente as atividades de catequese no aspecto da formação religiosa. Com a instalação da Diocese, uma das providências do Bispo foi trazer para a cidade o Movimento de Educação de Base (MEB), que muito contribuiu para a articulação das comunidades. O trabalho do MEB já era conhecido por Dom Augusto Alves da Rocha, mesmo antes de se tornar bispo. Devido ao conhecimento que tinha sobre as ações do MEB, posteriormente, Dom Augusto Rocha se tornou Membro do Conselho Diretor Nacional do MEB(Movimento de Educação de Base), de 1993 a 1999 em Brasília e Presidente Nacional do Órgão no ano de 2000.

Dom Augusto Alves da Rocha proporcionou um grande avanço para a formação das Comunidades Eclesiais de Base, na Diocese de Picos, através das Assembléias Diocesanas de Pastoral. Nesses encontros realizados anualmente e que prosseguem até os dias atuais, os membros das CEBs, têm direito a voz e voto. Os leigos engajados nas comunidades e escolhidos para participarem dessas assembléias debatem e votam decidindo as prioridades a serem implementadas nas áreas pastorais, paróquias, e na diocese, inclusive nas questões relacionadas com as análises políticas e a postura que a Igreja local deve ter sobre questões importantes.

Muitas lideranças sindicais e políticas surgiram na região de Picos, a partir da vivência nas CEBs. Algumas delas chegaram a ocupar e ainda ocupam cargos públicos em prefeituras e câmaras municipais. Isso, provavelmente não ocorreria se não existissem as Comunidades Eclesiais de Base, já que o coronelismo sempre comandou no interior nordestino.

As CEBs continuam seu trabalho na Diocese de Picos, ainda que tenham perdido muito daquela empolgação inicial. Para oferecer novo ânimo a essas comunidades, são realizados os Encontros Intereclesias de CEBs. Este ano de 2009, o evento aconteceu em Porto Velho, Rondônia, com a presença de milhares de participantes. Os membros das CEBs, que nasceram sob a égide de “Um novo jeito de ser Igreja”, agora buscam motivação para reavivar suas ações com “Um novo ardoar missionário”. Os integrantes das CEBs continuar a alimentar o sonho de “construir uma nova sociedade”. É a teimosia cristã de viver a utopia de que: “Uma nova sociedade, mais justa e fraterna é possível”.

Aluno - Erivan Lima , acadêmico de Jornalismo da faculdade Rsá Picos -PI

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